A empresa pode cancelar o plano de saúde do empregado que está afastado recebendo auxílio-doença comum?

Muitas empresas oferecem aos seus empregados plano de saúde, ou como um atrativo para reter a mão de obra, ou por força de determinação em Convenção/Acordo Coletivo.

Mas sempre sou questionado: quando o empregado se afasta do trabalho por muito tempo, em razão de uma doença ou acidente, a empresa pode fazer a suspensão ou o cancelamento do plano?

Inicialmente, é preciso fazer a distinção entre afastamento comum (com percepção de benefício B 31pelo INSS) e o afastamento por uma doença ou acidente de trabalho (com percepção de benefício B 91 pelo INSS).

No caso de doença ou acidente de trabalho, independentemente do tempo de afastamento, ou até mesmo se o empregado se aposentar por invalidez, não há a menor dúvida de que a empresa deve continuar mantendo o plano de saúde.

Este entendimento já está mais do que pacificado por meio da Súmula 440 do Tribunal Superior do Trabalho.

AUXÍLIO-DOENÇA ACIDENTÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. RECONHECIMENTO DO DIREITO À MANUTENÇÃO DE PLANO DE SAÚDE OU DE ASSISTÊNCIA MÉDICA. Assegura-se o direito à manutenção de plano de saúde ou de assistência médica oferecido pela empresa ao empregado, não obstante suspenso o contrato de trabalho em virtude de auxílio-doença acidentário ou de aposentadoria por invalidez.”

Mas, a grande discussão são naqueles casos em que o empregado se acidenta fora da empresa, no horário de folga, ou até mesmo quando é acometido por uma doença que não tem nenhuma relação com o trabalho.

Evidente que nestes casos a empresa não tem nenhuma culpa direta ou indireta, mas pode acabar tendo que suportar o ônus da manutenção do plano de saúde.

Isso porque, durante o período em que o empregado está de auxílio-doença comum, seu contrato fica suspenso, ou seja, não trabalha e não recebe, mas continua vinculado formalmente à empresa.

Assim, mesmo que o empregado já esteja há muitos anos nessa condição (recebendo auxílio-doença comum), as decisões judiciais estão caminhando para o sentido de que o plano de saúde não seja suspenso ou cancelado, já que o empregador teria o dever de garantir a integridade física do empregado e a conservação do plano de assistência médica durante o período de enfermidade.

Esse entendimento, apesar de controverso e ainda não estar pacificado, segue a linha de raciocínio segundo a qual a empresa tem um papel social, além de prezar pela dignidade do empregado.

Interessante ler os argumentos de uma recente decisão do Tribunal Superior do Trabalho nesse sentido:

PERCEPÇÃO DE AUXÍLIO DOENÇA COMUM. MANUTENÇÃO DO PLANO DE SAÚDE. APLICAÇÃO ANALÓGICA DA SÚMULA 440/TST. A figura da suspensão do contrato de trabalho se traduz na sustação ampla e bilateral dos efeitos da relação de emprego, que preserva, porém, sua vigência. Em princípio, praticamente todas as cláusulas contratuais não se aplicam durante a suspensão: não se presta serviço, não se paga salário, não se computa tempo de serviço, não se produzem recolhimentos vinculados ao contrato, etc. Desse modo, no período suspensivo, empregado e empregador têm ampla maioria de suas respectivas prestações contratuais sem eficácia. Embora seja comum entender-se que a suspensão é a sustação plena e absoluta de todas as cláusulas expressas e implícitas do contrato, há que se ressaltar que persistem em vigência algumas poucas obrigações do pacto empregatício. Nesse diapasão, de modo geral, os deveres contratuais que persistem no caso de suspensão contratual tratam, principalmente, de cláusulas que dizem respeito a condutas omissivas das partes. Por exemplo, não perdem eficácia as regras impositivas de condutas obreiras vinculadas aos deveres de lealdade e fidelidade contratuais. Também permanecem em vigor certas regras de conduta do empregador, como, por exemplo, aquelas relacionadas à integridade física e moral do empregado, a teor do que dispõe o art. 483, “e” e “f”, da CLT. Insere-se no contexto de garantia à integridade física e moral do empregado (que deverá ser preservada, como visto, ainda que suspenso o contrato de trabalho) a conservação do plano de assistência médica gerido pela empresa e que visa a resguardar precisamente aqueles que dele necessitam durante o período de enfermidade. Registre-se, ainda, que é um total contrassenso entender que os efeitos da suspensão do contrato de trabalho (decorrente, na hipótese, de afastamento previdenciário) inserem-se na hipótese de sustação lícita da obrigação patronal de manutenção do plano de saúde. Ao tratar da matéria, esta Corte editou a Súmula nº 440 cujo teor ora se transcreve: “AUXÍLIO-DOENÇA ACIDENTÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. RECONHECIMENTO DO DIREITO À MANUTENÇÃO DE PLANO DE SAÚDE OU DE ASSISTÊNCIA MÉDICA – Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012 Assegura-se o direito à manutenção de plano de saúde ou de assistência médica oferecido pela empresa ao empregado, não obstante suspenso o contrato de trabalho em virtude de auxílio-doença acidentário ou de aposentadoria por invalidez”. Vale registrar que esta Corte tem aplicado o teor da Súmula 440/TST, por analogia, à situação de concessão de auxílio-doença comum. Julgados. Na hipótese, é incontroverso nos autos que “o autor está afastado por auxílio-doença desde 22/10/2015 e o vínculo empregatício não foi rescindido”, que “houve o cancelamento do plano de saúde em setembro de 2016, uma vez que houve o encerramento das atividades, em que pese a carteira do convênio ‘coletivo empresarial’ ter validade até 31/08/2017”. No contexto fático acima relatado, o Autor faz jus à manutenção do plano de saúde pleiteado enquanto estiver afastado para tratamento de saúde, ainda que na modalidade auxílio doença comum. (PROCESSO TST-RR-30-66.2017.5.09.0130, Ministro Relator MAURICIO GODINHO DELGADO, DEJT 12.03.2021) (original sem grifos)

Evidente que tem empresas pequenas que lutam para manter suas contas em dia, e a depender do tipo de tratamento que o empregado afastado esteja fazendo, o valor do plano de saúde irá ter um custo muito maior.

Por exemplo, um empregado se afasta em recepção de benefício previdenciário comum (B31) por causa de um câncer. Após longo período de afastamento e com o avanço da doença, o tratamento vai ficando muito caro. No final do período de vigência do plano de saúde, quando a empresa vai fazer a renovação, além de ter pagado mensalmente um valor muito maior, por causa das consultas/exames/tratamento, certamente vai ter o valor seu plano de saúde aumentado consideravelmente, em razão da análise de riscos que as Operadoras fazem.

E esta é uma situação muito delicada, tanto para o trabalhador necessitado quanto para a empresa.

 

 

Não podemos esquecer daquelas situações em que o empregado paga uma cota parte no plano de saúde (situação muito comum), mas pelo fato de não estar trabalhando, só vai acumulando um saldo devedor muito grande junto à empresa.

Nesses casos, sempre aconselho a empresa notificar formalmente o empregado, para negociar o pagamento da sua cota parte, sob pena até mesmo da suspensão ou cancelamento.

Da mesma forma, no decorrer dos anos muitas empresas fazem a mudança de Operadora do plano de saúde, devendo o empregado afastado que goza do benefício ser notificado formalmente para regularização, também sob pena de suspensão ou cancelamento.

Portanto, é muito importante estar atento a estas questões caso a empresa queria fazer a suspensão e ou cancelamento do plano de forma correta.

 

Goiânia, maio/2021.

Rafael Martins Cortez

Advogado especialista e assessor jurídico/empresarial

 

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